De todos os anos em que venho acompanhando os mercados financeiros nenhum deles foi tão recheado de razões para não acreditar em filosofias do tipo "buy-and-hold" como o de 2008. Em Wall Street todas as regras e legislações no mercado de capitais só valem se o price action for positivo. No sistema monetário de fiat money que sucedeu o gold-standard o maior ativo é a confiança (legal tender), duramente atingida por bailouts com dinheiro do contribuinte, manipulações grosseiras de normas operacionais, ocultação de dados, etc. A falência moral anda de mãos dadas com a financeira. Claro, a quase totalidade de eleitores (digo, investidores) só ganha se o preço dos ativos subirem.
Ao repertório de picaretagens a Securities and Exchange Comission (SEC) adicionou mais uma final do mês passado: a flexibilização da regra de marcação a mercado ("mark to market"). A justificativa oficial não revelada é que transparência só é bem-vinda em bull markets. Em mercados declinantes a performance das carteiras a valores de mercado - perda meramente contábil - pode trazer perdas reais para os detentores de títulos, especialmente bancos.
Em Pindorama a necessidade de rever normas operacionais não existe, mesmo porque as existentes não são obedecidas nem fiscalizadas. Aqui a crise de crédito não mostrou sua face aguda porque o sistema creditício é anão e o uso de derivativos é restrito. Outro dia vi uma entrevista de um representante da Febraban gabando-se da "solidez" dos bancos nacionais. A pouca alavancagem tem a ver com as taxas de juros reais obscenas e não com memórias dos tempos de inflação galopante. O mais preocupante do credit crunch atual não está no sistema bancário nacional e sim nos setores não-financeiros cujos profissionais mostram despreparo - ou seria esperteza escamoteada? - em instrumentos financeiros nem tão sofisticados. Conseguem transformar um suposto hedge em drink de cianeto para os acionistas. Mostrem-me uma empresa de capital aberto que auferiu resultados positivos em instrumentos financeiros relativamente simples (contratos de swap) e ganhe um pirulito. Os empréstimos de R$2bi da Caixa Econômica Federal e de
R$750M do Banco do Brasil à Petrobrás mostram como a parte sensível do credit crunch em Pindorama está nos setores de empresas não-financeiras.
Pra terminar, vos digo que não há nenhum paradigma visto nas últimas décadas que se compare com o que vemos atualmente. Os relatórios que eventualmente leio são reflexos de profundos conflitos de interesse entre instituições e clientes. A atuação desastrosa dos principais bancos centrais em tentar suavizar a queda está em vias de gerar uma estagnação econômica "multianual" à la Japan nos EUA e na Europa. Criaram um cenário idílico de que bastariam injeções gigantescas no meio monetário circulante para garantir a prosperidade eterna. Não é possível criar riqueza com printing presses. Se estou certo...Only future will tell.